Fui convidado para
falar na Audiência pública do último dia 20 de maio, na Câmara Municipal de
Guarulhos. Antes de falar e duas vezes no início da minha fala fui interrompido
por vaias de um pequeno grupo favorável à inserção da chamada ideologia de gênero
no plano de educação do nosso município. Acabei comparando o grupo que só
gritava a um bando de cachorros. Não os chamei de cachorros. Quando você se
encontra diante de cachorros que latem e avançam, não adianta falar, os
cachorros não se acalmam. Não queriam me ouvir, então não falei. Entretanto,
disponho de outros canais para falar para quem quer ouvir, como a nossa Folha
Diocesana. Abaixo, então, o texto do que deveria ter pronunciado na Câmara
Municipal.
Senhoras, Senhores,
irmãos e irmãs.
Agradeço a
oportunidade de poder falar nesta audiência pública.
Não tenho competência
para falar de todos os pontos do PNE. Entretanto, aquilo que nos preocupa
enquanto Igreja é a questão da chamada educação sexual. Não tive contato com o
argumento próprio para o nosso município, mas como o PNE foi passado à
responsabilidade dos Estados e municípios já com o conteúdo que vinha sendo
proposto a nível federal, achamos por bem abrir um espaço para a reflexão. Esta
audiência pública é uma boa oportunidade.
Primeiramente estou
aqui por causa da minha fé em Jesus Cristo e a missão que Ele deixou à sua
Igreja. A minha fé não está em contraste com a razão e a ciência. Na fé cristã
acreditamos que Deus criou o homem à sua imagem, homem e mulher. O Criador não
tem sexo, mas Deus é comunhão de pessoas (a Trindade). Assim a diferenciação
dos sexos é para que o ser humano possa perfazer esta sua vocação de ser imagem
de Deus: comunhão de amor. Uma das formas sublimes deste amor se manifestar,
amor este que é espiritual, é na união sexual que não está voltada para si
mesma, mas aberta à doação para o outro e aberta à vida que pode ser gerada. Na
fé também acredito que esta obra maravilhosa de Deus foi danificada pelo pecado
que inverte todas as coisas e é contrário ao amor.
Peço desculpas por
usar certas categorias filosóficas que não fazem parte do nosso falar
cotidiano. Por causa desta fé acredito que a essência precede a existência. Ser
masculino ou feminino é algo essencial, seja do ponto de vista fisiológico,
bioquímico e psicológico. Não há como ser neutro. Se aparece na existência
algum acidente, ele é posterior à essência. Muda, sim, o concreto da
existência, mas é posterior. Em alguns pontos da educação sexual pretende-se
mudar esta ordem, de modo que caberia à pessoa escolher a sua orientação
sexual. Por detrás desta configuração existe um aspecto da corrente do
existencialismo ateu sartriano que propaga que a existência precede a essência.
Ser masculino ou
feminino nos dá uma identidade. Ser masculino ou feminino não difere na
dignidade. Como vivenciar o ser masculino ou feminino acarreta consequências
morais e éticas.
Grande parte da
natureza manifesta esta dupla de identidade de gênero, não como pobreza, mas
como riqueza.
Ainda que a chamada
ideologia de gênero não trate especifica e exclusivamente da questão da
homossexualidade, quero inserir aqui uma breve reflexão. Acredito que nenhum de
nós, aqui presente, tenha escolhido a própria orientação sexual. Acredito
também que, não somente por questões culturais e sociais, as pessoas com
orientação homossexual tenham se sentido angustiadas, mas na vivência da
própria existência travaram e travam conflitos consigo mesmas. Este conflito
existe exatamente porque não se trata de uma escolha pessoal, mas um ou vários
acidentes tornaram assim a situação.
Quero também afirmar
que a pessoa humana é muito, muito mais que a sua orientação sexual. Neste
sentido é importante educar para a grandeza da dignidade da pessoa humana, que
encontra sua plena realização no amor. Amor que significa ser para o outro, não
buscando simplesmente a si mesmo. Compreender a orientação sexual como uma
situação e não como uma opção ajuda e muito a respeitar o outro e desbaratar
tantas atitudes chamadas homofóbicas que tem feito muitas pessoas sofrerem.
Acredito que todos estamos concordes em não aceitar a violência contra as
pessoas.
Peço que o PNE em
nosso município saiba encontrar estruturas que eduquem não só para o respeito,
mas principalmente para amor-doação. A nossa sexualidade é dom de Deus e o sermos
seres sexuados é que nos faz capazes de amar. Educar para virtude da castidade
também é importante, pois esta virtude libera o amor de manifestações egoístas.
Peço que se tenha cuidado para não reduzir a educação sexual a educação
genital. A nossa sexualidade é muito mais que genitalidade.
Obrigado pela atenção.
+Edmilson Amador Caetano, O.Cist.
bispo diocesano de
Guarulhos
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